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sexta-feira, 19 de julho de 2013

Bicicletas e sonhos




por Beto Pacheco

Bicicleta, um objeto lúdico. Gosto muito de andar de bicicleta, apesar de a minha atual estar encostada, com o pneu murcho, algumas partes começarem a mostrar ferrugem e a preguiça parecer ter criado em volta dela um campo de força que me impede de salvá-la de sua tumba. Enfim, mas bicicleta é legal. Pedalar é legal. Saudável e tal, papos contemporâneos. Contudo, apesar dessa função eco-social recentemente percebida, há tempos ela povoa o imaginário das crianças, que as destroem em anos de uso. Ah, a infância, aquela fase em que acelerar numa subida ainda não nos faz quase ter uma síncope.

Lembram-se do E.T., “phone, home”? Aquela cena das bicicletas voando, tendo a lua como cenário, é antológica. Aliás, tive medo do E.T. a primeira vez que o assisti no cinema, mas essa é outra história, estou aqui para falar de bicicletas. Aprendi a andar de bicicleta em uma fazenda. Roxos e arranhões, é o que vale contar sobre esse fato. É um desses momentos em que percebemos, num rompante, sermos capazes de algo que até então parecia literalmente impossível. Deve ser assim também quando aprendemos a falar. “Mamãe!” soltam as cordas vocais enquanto o pensamento emenda “CARACA, EU TÔ FALANDO!”. Pena não nos lembrarmos desse momento. Pena não nos lembrarmos de muita coisa, apesar de elas estarem lá, enterradas em algum canto.

Lembro bem, por exemplo, do dia em que ganhei a minha primeira bicicleta, mesmo preferindo que aquele dia nunca tivesse existido. Era Natal e Papai Noel me trouxe de presente uma Monark BMX Arco-Íris, rodas vermelhas. Fiquei maluco ao ganhar. Meu pai até permitiu que eu pedalasse na rua em frente, mesmo sendo noite. Ousado esse meu pai. No dia seguinte, acordei por volta de 6h da matina (isso deve ter acontecido umas três vezes em toda a minha vida) só para andar de bicicleta. Andei, andei e andei com minha bike a manhã toda. Época em que eu não cansava, nem suava. Devia ser nos idos do Paleolítico, não tenho certeza.

Por volta do meio-dia, um casal de vizinhos se aproximou. “E aí, gostou da bicicleta?”, perguntaram. Respondi “Muito!”, feliz e já imaginando o que é que eu pediria 
no próximo Natal ao Sr. Noel, já que ele era realmente generoso. Foi quando os vizinhos mandaram: “Essa bicicleta ficou umas duas semanas escondida lá em casa. Seu pai pediu para guardarmos até o Natal”. 

Meu pai? Guardar? Escondida? Mas e o Papai Noel?

E como se um jato d’água partindo de um caminhão de bombeiros me atingisse, descobri tudo. Mais rápido que dizer “Mamãe!” e se dar conta de que se sabe falar. Ele não existia! O Bom Velhinho, tudo papo furado. Devo ter ficado de boca aberta, olhando para eles, por eternos segundos. “Então, tchau, divirta-se com seu presente”, despediram-se.
. Diga-me, precisavam contar? Certeza que foi na maldade. Devem ter acordado naquela manhã e dito “Hoje teremos no almoço canelone ao molho de sonhos triturados”. Lambendo os beiços, enfiaram uma estaca no coração da minha infância, torceram e foram embora como se nada tivesse acontecido. Desmontei do selim e voltei para casa, atônito, cabisbaixo, empurrando lentamente a BMX. Ao longo daqueles metros pensei muito no Coelhinho da Páscoa e fiquei imaginado como, diabos, eu iria dar a ele aquela terrível notícia.

1 comentários:

  1. É bom encontrar blogs como o seu, blogs onde nos sentimos bem a ler o conteúdo, e sabemos que aqui há vida e a graça de Deus, fico feliz por ver está a ser um vaso nas mãos de Deus, Ele usa em poder e graça. Parabéns pelo seu blog. Se desejar visite o Peregrino E Servo,leia alguma mensagem e deixe a sua opinião.
    Ps. se ainda não segue faça-o agora eu vou retribuir seguindo o seu blog também. Abraço fraterno.

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